O delegado federal Maurício Moscardi Grillo afirmou, na manhã desta sexta-feira (17), que produtos químicos foram usados pra disfarçar a carne vencida. A Polícia Federal (PF) repassou mais detalhes sobre a operação “Carne Fraca”, que apura a venda de carnes vencidas, em coletiva de imprensa nesta sexta-feira (17).
“Eles usavam ácidos e outros produtos químicos para poder maquiar o aspecto físico do alimento. Usam determinados produtos cancerígenos em alguns casos para poder maquiar as características físicas do produto estragado, o cheiro”, disse.
Moscardi também disse que água era injetada na carne para que o peso aumentasse. Também foi verificada a falta de proteína na carne. “Foi trocada por fécula de mandioca ou proteína da soja, que é muito mais barata, mais fácil de substituir”, explicou.
Moscardi acrescentou que nem mesmo os fiscais envolvidos, que costumavam ganhavar carnes dos proprietários como benefício, estavam aguentando a má qualidade dos produtos. “Eles comentavam entre si que não estava mais dando para receber”, disse.
Além de Moscardi, participam da coletiva de imprensa o superintendente da PF, Rosalvo Ferreira Franco; o delegado federal Igor Romário de Paula; e o auditor da Receita Federal Roberto Leonel de Oliveira Lima.
A operação apura o envolvimento de fiscais do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa) em um esquema de liberação de licenças e fiscalização irregular de frigoríficos. A denúncia foi feita por um deles.
Segundo a polícia, a “Carne Fraca” é a maior operação já realizada pela PF no país. Pela manhã, funcionários do ministério foram detidos.
As investigações chegaram às principais empresas do setor, como a BRF Brasil, que controla marcas como Sadia e Perdigão, e também a JBS, que detém Friboi, Seara, Swift, entre outras marcas.
Gravações telefônicas apontam que frigoríficos vendiam carne vencida tanto no mercado interno, quanto para exportação.
Em contato com o G1, a JBS afirmou que não tem informação de que algum executivo seu foi preso e informou que não há operação da PF na empresa. A reportagem tenta contato com os demais citados pela Polícia Federal.
Segundo as investigações, o esquema no Paraná era comandado pelo ex-superintendente regional do Mapa, Daniel Gonçalves Filho, e pela chefe do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Dipoa), Maria do Rocio Nascimento, que trabalham em Curitiba.
Na casa do atual superintendente regional do Mapa, Gil Bueno, a polícia apreendeu R$ 65 mil nesta manhã. Os três são alvos de prisão preventiva.
De acordo com informações da Polícia Federal, a investigação começou porque um fiscal não aceitou ser removido quando descobriu fraudes em uma das empresas investigadas.
Em sua decisão, o juiz federal Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara Federal de Curitiba, diz que o envolvimento do Ministério da Agricultura é “estarrecedor”. “(O ministério) foi tomado de assalto – em ambos os sentidos da palavra – por um grupo de indivíduos que traem reiteramente a obrigação de efetivamente servir à coletividade”, afirmou.
Carne vencida
Gravações telefônicas obtidas pela Polícia Federal apontam que vários frigoríficos do país vendiam carne com data de validade vencida tanto no mercado externo, quanto para exportação.
Entre produtos químicos e produtos fora da validade, há casos ainda mais “curiosos”, como a inserção de papelão em lotes de frango e carne de cabeça de porco em linguiça.
Diretores e donos das empresas estariam envolvidos diretamente nas fraudes, que contavam com a ajuda de servidores do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, no Paraná, Goiás e Minas Gerais.
No Paraná. há ramificações em Londrina, no norte do estado, e em Foz do Iguaçu, na região oeste do estado. No Rio Grande do Sul, são cumpridos mandados nas cidades de Gramado e Bento Gonçalves, na serra gaúcha, segundo apurou o G1 RS.
Em São Paulo, são 18 mandados no total, sendo 8 de busca e apreensão, 3 de prisão preventiva, 1 de prisão temporária e 6 de condução coercitiva, todos na capital, de acordo com informações do G1 SP.
Operação nacional
A operação detectou, em quase dois anos de investigação, que as Superintêndencias Regionais do Ministério da Pesca e Agricultura do Estado do Paraná, de Minas Gerais e de Goiás atuavam diretamente para proteger grupos empresariais em detrimento do interesse público.
Mediante pagamento de propina, os agentes públicos suspeitos atuavam para facilitar a produção de alimentos adulterados, emitindo certificados sanitários sem qualquer fiscalização efetiva.
Entre as ilegalidades praticadas no âmbito do setor público, está a remoção de agentes públicos com desvio de finalidade para atender a interesses dos grupos empresariais.
A conduta permitia a continuidade da ação fraudulente de frigoríficos e empresas do ramo alimentício que operavam fora das regras vigentes.
Em Goiás, o sistema operava de forma parecida com o paranaense, sendo chefiado pelo chefe local do Dipoa, Dinis Lourenço da Silva.
Em Minas Gerais, o juiz federal Marcos Josegrei da Silva afirma que as investigações foram insuficientes para aprofundar o tamanho dos atos de corrupção envolvidos.
Aproximadamente 1,1 mil policiais federais cumprem 27 mandados de prisão preventiva, 11 de prisão temporária, 77 de condução coercitiva e 194 de busca e apreensão em residências, locais de trabalho dos investigados e em empresas supostamente ligadas ao grupo criminoso.
As ordens judiciais foram expedidas pela 14ª Vara da Justiça Federal de Curitiba e estão sendo cumpridas em São Paulo, Distrito Federal, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Goiás.
O nome da operação faz alusão à conhecida expressão popular em sintonia com a própria qualidade dos alimentos fornecidos ao consumidor por grandes grupos corporativos do ramo alimentício.
Conforme a PF, a expressão popular demonstra uma fragilidade moral de agentes públicos federais que deveriam zelar e fiscalizar a qualidade dos alimentos fornecidos a sociedade.
Fonte: G1